Escárnio e ironia em versos subversivos
“Sucupira não é aqui?”, de Henrique Duarte Neto, confronta a decadência humana por meio de uma poesia de linguagem apurada
Nos versos do livro Sucupira não é aqui?, de Henrique Duarte Neto, pilhéria, escárnio e ironia despontam como armas líricas para confrontar o ápice da decadência humana, isto é, o agora. Para dar conta dessa missão subversiva, sem cair em tom panfletário, o autor – em 72 páginas de temáticas variadas – se apega aos ensinamentos do mexicano Octavio Paz (1914-1998): poesia como ato inaugural e fome de realidade.
Palavras do autor
“Falar de seu próprio livro nem sempre é uma tarefa singela, principalmente quando o livro evita os acordes cintilantes da música mais soporífera”, começa o poeta e ensaísta catarinense. “Sim, neste livro a música é dissonante, pois a poesia vislumbra um horizonte de horrores, num senso de decadência da humanidade, que nunca parece ter descido tão baixo.”
“A pilhéria, o escárnio e a ironia são, neste sentido, as armas que o poeta encontra para subverter uma lógica nefasta, a lógica do poder capitalista e/ou do capital poderoso frente às massas”, continua o doutor em Literatura. “Mas não se engane o leitor: o livro está longe do panfleto realista, pois a operação que se trama com e na linguagem opera uma subversão na ordem sintático/semântica, oscilando naquilo que Octavio Paz menciona, em O arco e a lira, como as duas possíveis fontes da poesia, ou seja, poesia como ato inaugural e também como fome de realidade. Ao trabalhar com os opostos, ao intercambiá-los, o poeta pensa que, tal como o prestigioso autor mexicano, foi feliz na sua empreitada.”
Agora, com a palavra, Ademir Demarchi
Responsável por organizar antologias e autor de diversos livros de poesia e crítica literária, o paranaense – também doutor em Literatura – assina o prefácio de Sucupira não é aqui?. Abaixo, parágrafos de abertura do texto:
O leitor desavisado que não se deixe enganar pela indagação no título deste novo livro de Henrique Duarte Neto. De forma alguma ele expressa uma dúvida, pois reafirma antes a veemência irônica de constatar afirmativamente a naturalização do absurdo que leva à certeza de se dizer que, sim, Sucupira é aqui, onde tudo é possível acontecer.
E, nestes últimos anos, tendo à memória o que foi o país, tudo aconteceu de tal forma que aquela minúscula cidade imaginada por Dias Gomes, a Sucupira do histriônico prefeito Odorico Paraguaçu, de O bem-amado, pareceu confirmar a metonímia insinuada por Henrique: deixando de ser apenas a metáfora imaginada por Gomes, Sucupira cresceu de forma espetacular e se tornou o país.
O autor | Henrique Duarte Neto
Poeta e ensaísta, nascido e residente no interior de Santa Catarina, Henrique Duarte Neto já publicou alguns livros de crítica literária e outros tantos de poesia, sendo que esta última também se encontra parcialmente disseminada por algumas revistas e blogs nacionais. É graduado em Filosofia e doutor em Literatura, pela UFSC, com pós-doutorado em Estudos Literários, pela UFPR. Persegue no poema aquilo que seria o seu sumo – inesgotável e salutar busca.