Amor, medo, fome e morte: a poesia de Antonio Manoel Conceição
Nos versos reunidos em “Poesias de amor, de vida e de morte”, autor apucaranense parte da observação do mundo para entender sua própria solidão
Nos versos do livro Poesias de amor, de vida e de morte, o apucaranense Antonio Manoel Conceição parte da observação do mundo – natureza, pessoas, animais frágeis e abandonados – para elaborar uma voz lírica que tenta compreender sua própria solidão. Nas palavras do autor, trata-se de um “empréstimo deste mundo em que vivemos”.
Quando Conceição ainda era uma criança, uma tia portuguesa comentou: “Esse menino tem os olhos morteiros”. A definição conversa com um sentimento que acompanha o autor desde que ele, ao ver um pôr do sol, deu-se conta da finitude da vida – devido à transição do dia para a noite, talvez, quando a luz é substituída pela escuridão.
Na obra, o eu lírico busca se mostrar por inteiro: apresenta seus medos e procura entender a solidão que lhe vai na alma. “São reflexos dos dias, dos ruídos e do sentimento de solidão”, comenta o autor, que também possui uma sólida carreira acadêmica, a respeito do conjunto.
Poema | “Questão de biografia”
O lixo vive.
Parece morto, mas vive
Sorrateiros e silenciosos
Os restos atestam
Que algo está presente
Retalhos de conversas
Continuam assombrando
Os papéis esquecidos nas latas
Uma história de mentiras,
O medo encravado em um pacto de maldades
Um contrato permanente com a morte
A ser registrado em um futuro determinado
Sub-reptícios, asquerosos, contorcidos
Assim somos nós,
Partes de um mesmo lixo
No fundo dessa lata universal
Nossa carne mistura-se aos dejetos
Em uma simbiose nojenta e repugnante
No entanto, as moedas nos limpam
Do sangue de nossas mãos
Da gosma de nosso veneno diário
À vista desse ouro insubstituível
Mágico e resplandecente
Todo erro desaparece
Confessar os pecados nos purifica
Porque a causa parece justa
E na dúvida seremos santos
Beatificados pelas desculpas inventadas
Com nossos nomes devidamente
Escritos à margem das enciclopédias
Absolutamente ilustres e dignos
Afinal o que conta é a biografia
Ainda que no fundo
Sejamos apenas lixo.
O autor | Antonio Manoel Conceição
É apucaranense. Formado em Contabilidade pela FECEA-Apucarana, fez mestrado em Engenharia de Produção pela UFSC-Florianópolis e doutorado em Serviço Social e Política Social pela UEL-Londrina. Nasceu, cresceu, enraizou-se e permanece em Apucarana-PR. É autor inédito de poesias e contos.